quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Para ele



Nos conhecemos sem a menor pretensão de nos apaixonar, mas a sua loucura combinou com a minha, o seu preto no meu branco, o seu sim no meu não, o seu aberto no meu fechado, o seu sol e a minha lua, o meu frio e o seu calor, o meu arroz com feijão juntos e o seu separado, a minha coca e a sua fanta... Dizem que os opostos se atraem, eu diria que se completam. De tão diferentes somos tão iguais. Meu amor, meu espelho. 

terça-feira, 27 de agosto de 2013

Segredo

Filho, eu tenho um segredo pra te contar: Sempre tive medo de perder o seu pai para a morte. 
Naquela noite, quando eu recebi a ligação da sua vó, antes mesmo dela falar qualquer coisa, eu sabia que ele tinha partido. Não posso te afirmar que existe o mundo espiritual, mas, se realmente existe, eu já estava avisada que aquilo iria acontecer. E eu já sabia que você estava a caminho para me salvar. Estou a sua espera. 

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Em casa


Quando o conheci me senti “em casa”, percebi uma afinidade incrível, conseguíamos conversar abertamente, nos entendíamos, riamos um do outro, sem medo de ser quem éramos em realidade. Me lembro da nossa primeira conversa profunda, na ilha, ele me disse que nunca tinha contado aquilo a ninguém mais.
Ele me conhecia muito bem, afinal nunca tentei ser outra pessoa para que ele gostasse de mim. Ele me amava assim mesmo, filho, com ou sem maquiagem, largada ou arrumada, mais gorda ou mais magra, falando besteira, com espinha, fazendo gracinha pra ele rir, até reclamando ou de mau humor. Nunca tinha me sentido tão a vontade com outra pessoa, sei que ele também sentia isso ao meu lado.. Por isso ele era meu melhor amigo e meu amor. Era tudo muito simples, muito gostoso de viver. 
Eu o conheci muito bem, tentei entender mais afundo, alem das aparências, e era incrível, cada dia descobria algo novo em seu pai.. Seu jeito de "solto leske" ou "bixo solto", como ele dizia, era só uma capa que escondia a pessoa mais generosa que eu já conheci. Ele me ajudou a que me conhecesse melhor.. Eu também o ajudei a que ele se conhecesse melhor, ele tinha algumas características peculiares, lindas, que nem ele conhecia e eu as desvendei direitinho. Não é a toa que ele se revelou um homem muito romântico, modéstia parte eu fiz um bom trabalho, filho! 
Juntos nos conhecemos melhor. Eu a ele, ele a mim, eu a mim mesma, ele a si mesmo, nós a nós dois. E agora, mesmo depois de sua partida, relembrando momentos e conversas, eu continuo me conhecendo e aprendendo com ele. 

sábado, 24 de agosto de 2013

Liberdade

Quando penso em seu pai essa é uma palavra que me vem logo em mente. Era um desejo, um destino, uma certeza. Ele dizia que Deus nos fez livres e nos deu esse direito, mas a sociedade nos corrompe de uma forma muito sutil, e desde que nascemos somos obrigados a nos acostumar com isso. Ele tinha certeza que iria alcançar a liberdade que queria, eu achava sonhador, utópico, mas agora eu entendo. Hoje, em um mundo longe daqui, perto de Deus, sei que seu pai é livre.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013



"Mas o tanto que eu levar de você
Eu deixo um pouco pra me misturar
E não descanso pra você dormir"
Terminei indo- China
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=_qfguyssBzs


Vida X Morte


Não estamos preparados para a morte. Sabemos que é a única certeza da vida, porém na pratica achamos que somos imortais, vivemos como se houvesse sempre mais um dia e deixamos para amanhã o que podíamos ter feito hoje, o amor que podíamos ter dado ao próximo, a ligação que podíamos ter feito para as pessoas que amamos e perdemos o contato na rotina do dia-a-dia, ver e conversar com os amigos, dar um abraço apertado, aquele ‘eu te amo’ que ficou na ponta da língua...
Eu nunca tinha me deparado com a morte desta forma, repentina, prematura e assustadora. Já tinha perdido avô e bisas... Apesar de terem sido momentos muito tristes e difíceis, principalmente a do meu avô porque foi um susto para todos, de alguma maneira era algo que nos preparamos para enfrentar, ver os mais velhos partirem antes de nós. Ano passado vi duas pessoas jovens e amigas perderem a vida de forma prematura em diferentes situações, foi a morte antecipada chamando a minha atenção aos pouquinhos. Este ano, quando seu pai e seu tio Caio nos deixaram foi inesperado, eu não estava preparada, demorou para me acostumar com a ideia de que pessoas jovens com eu também morrem. A morte não é nada previsível.
Você já irá nascer sabendo o que é a morte e que ela é realmente imprevisível. Você vai nascer sem a presença física do seu pai mas o terá como anjo da guarda. As vezes penso que é uma tristeza seu pai não poder estar aqui para viver algumas coisas com você, ele iria babar tanto, mas logo lembro que ele as estará vivendo de forma ainda mais intensa onde ele estiver. Tentarei passar para você a naturalidade da vida e da morte, quando nascemos damos a primeira inspiração (bem vindo à vida) e quando morremos damos a ultima expiração, soltando o ar, deixando a vida.
Eu espero que ao te ensinar tudo isso eu também aprenda. Gostaria de dar o exemplo para você, não quero ser daquelas mães que falam muito mas agem bastante diferente. Acho que quando eu superar tudo isto, já poderei lhe ensinar pelo menos o que é força.  

sábado, 17 de agosto de 2013

Falta nossa de cada dia

Todos os dias, alguns mais que outros, sinto muita falta....
Falta da voz grossa falando comigo com voz de bebê
Falta das piadas
Falta das cosquinhas
Falta do abraço
Falta do beijo
Falta das mordidas que eu tanto reclamava
Falta das risadas gostosas, dele, minhas e nossas
Falta das conversas profundas
Falta das conversas sem nexo também
Falta do jeito de se fazer de durão mas que se derretia quando me via
Falta do capacete da moto
Falta do omelete delicioso
Falta das ligações a qualquer hora
Faltas das caras e bocas, que eram característica de seu pai
Falta das gírias
Faltas das músicas
Falta da massagem nos pés
Falta da orelhinha linda
Falta daquele olhar
Falta da preocupação que ele tinha com nós dois
Falta das reuniões da empresa
Falta dos rangos da madrugada
Falta das saídas alternativas
Falta da praia
Falta das viagens
Falta da presença
Falta daquele quarto cheio das coisas dele
Falta dele dirigir para mim
Falta de me buscar a qualquer hora em qualquer lugar
Falta do topa tudo
Falta da bela vista
Falta do carinho
Falta das brincadeiras
Falta de ouvi-lo falar com tanta paixão sobre o futuro
Falta das ideias inovadoras
Falta da amizade
Falta do amor
Falta das mãos e dos pés
E dos braços, e das pernas, e da boca, e do nariz
E de tudo.

sábado, 10 de agosto de 2013

Vazio

Sabe o que é estranho da morte? Eu falo e ele não responde, eu grito e ele não me ouve, eu brigo, faço birra, bato perna, faço piada, rio e choro... Sozinha. 
Me lembro chegar no enterro e olhar aquela multidão de pessoas que já estavam lá... Eu não sabia o que fazer, para onde ir, para onde olhar, com quem falar.. Minhas pernas estavam bambas, meu corpo tremia, minha mente confusa, eu via tudo girar, as lagrimas escorriam sem eu perceber, sentia que ia desmaiar antes mesmo de chegar perto. Primeiro avistei o caixão do seu tio Caio, e me deu um alivio perceber que, apesar de sem vida, ele ainda estava lindo e perfeito, mas não me aproximei, olhei para o outro lado procurando seu pai, e ele estava ali bem ao lado de seu tio. Lindo como sempre. Fiquei parada olhando seu corpo inerte, sem vida, eu só queria gritar, sumir, acordar daquele pesadelo... Eu olhava seus avós chorando, olhando para os corpos sem vida de seus dois filhos, parecia surreal demais. Por que meu Deus? Muitas pessoas me abraçavam e tentavam me consolar, mas para mim aquilo que estava acontecendo não era real, eu não conseguia aceitar que seu pai jamais voltaria a abrir os olhos. 
O ironico é que ele estava lindo, com um rosto sereno, só faltava aquele sorrisão. Eu queria um abraço quente, um beijo apaixonado... Mas nunca mais os teria. 
Eu estava sem chão. Já tinha ouvido essa expressão antes, várias garotas da minha idade usam quando terminam um namoro. Nesse momento fiquei com raiva de todas elas por usarem expressões tão fortes em situações tão banais. Eu sim estava perdida, nunca mais voltaria a ver o meu amor com vida. 
Eu olhava ao redor para os rostos daquelas pessoas chorando, mas ninguém sentia uma dor parecida com a minha. Eu olhava procurando que alguém me dissesse que era tudo uma brincadeira de mau gosto. Eu olhava para seus avós, aquela família destruída, e me sentia pior ainda... Meu filho, nenhum pai/ mãe é preparado para enterrar seu filho, muito menos dois. 
Eu estava enterrando ali uma parte de mim que me foi arrancada bruscamente, sem nenhum aviso, pedido de licença, sem nenhuma despedida.
Lembro de depois chegar em casa e não ter a mínima noção do que fazer, sentia um vazio inexplicável, não pensava em outra coisa, não conseguia ver tv, nem abrir o computador, nem ler, muito menos ouvir música... Passei algum tempo sem conseguir ouvir música. Passei também alguns dias sem conseguir pregar o olho. Ainda passo noites assim. 
Os dias passam e a gente acha que o vazio vai diminuir... Mas não diminui, a gente só se acostuma com a nova rotina, mas ainda existe um buraco gigante dentro de mim. E não é aquele tipo de buraco de quando a gente muda de país, ou termina um namoro, ou vai morar sozinho. É um buraco que é real, é o vazio que a morte deixa na gente e só nos resta aceitar.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Amor de verdade


Nossa primeira briga foi engraçada. Foi a única. Já estava grávida de você mas nem lembro do motivo, só lembro que eu estava muito mal humorada (segundo ele, “cheia dos hormônios”) e procurava mil motivos para brigar. Estávamos num bar e brigamos a noite toda, depois fomos para sua casa pois ficava perto e estava chovendo muito aquela noite, lembro que no caminho vimos um acidente de carro. Mas continuamos brigando e assim ficamos até o dia amanhecer e a chuva diminuir, quando decidi ir para minha casa... E mesmo assim continuei mandando mensagens desaforadas, ele desligou o celular e foi dormir. Isso me irritou ainda mais, eu realmente estava “cheia dos hormônios”, lembro que a ultima mensagem que mandei foi algo do tipo “se eu morresse hj vc ia sentir a minha falta”, depois disso percebi que tinha exagerado e desisti, desliguei o celular também e fui dormir. Acordei mais tarde com seu pai ligando para minha casa dizendo que estava indo me buscar pois precisávamos conversar. Eu gelei, pensei que ele estava me achando uma louca e que iria terminar comigo, entrei no carro e meu coração saltava pela boca, meus olhos arregalados, eu temia que tudo acabasse ali e foi a segunda vez que senti um medo incontrolável de perde-lo. Mas ele olhou nos meus olhos e falou com voz de bebê “Marxella nunca mais me mande uma mensagem daquela! Se você morresse eu não iria sentir sua falta, eu ia ter que morrer junto”. E me implorou perdão por não ter sido tão cuidadoso comigo e por ter me deixado chegar aquele ponto de estresse. Eu desabei em lagrimas, também pedi perdão afinal a culpa era minha, eu criei a briga por algum motivo banal, mas ele insistiu e assumiu a culpa. Aquela atitude me surpreendeu, tive mais certeza ainda que ali estava o homem que eu amava e que me amava e só queria me fazer feliz. Senti um alivio imenso, me senti completa! Respirei fundo e agradeci a Deus por ter um amor de verdade.